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Dever das Indústrias Farmacêuticas e Laboratórios de informar o Consumidor sobre os riscos do medicamento

Conforme julgado pelo c. Superior Tribunal de Justiça, as fabricantes de medicamentos têm um dever de informar diferenciado, previsto no artigo 9º do Código de Defesa do Consumidor. 

Isso implica dizer que todos os riscos do uso do medicamento comercializado deve ser suficientemente alertado aos Consumidores. 

Quando o fabricante omite dos Consumidores possível reação adversa para a saúde do paciente, está incorrendo em violação deste dever. 

Confira o julgado:

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E COMPENSAÇÃO DO DANO MORAL. MORTE DA PARTE AUTORA ANTES DA INTERPOSIÇÃO DO RECURSO. DESCONHECIMENTO DO FATO PELOS ADVOGADOS E AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA MÁ-FÉ. SUCESSÃO PROCESSUAL REQUERIDA PELO ESPÓLIO E REGULARIZAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. VALIDADE DOS ATOS PROCESSUAIS. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AUSÊNCIA.
RISCO INERENTE AO MEDICAMENTO. DEVER DE INFORMAR QUALIFICADO DO FABRICANTE. VIOLAÇÃO. DEFEITO DO PRODUTO. RISCO DO DESENVOLVIMENTO.
DEFEITO DE CONCEPÇÃO. FORTUITO INTERNO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO FABRICANTE CONFIGURADA. CULPA CONCORRENTE DO CONSUMIDOR AFASTADA.
COMPROVAÇÃO DOS DANOS EMERGENTES E DOS LUCROS CESSANTES. NECESSIDADE DE LIQUIDAÇÃO DA SENTENÇA. REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA 7/STJ.
DANO MORAL. MAJORAÇÃO DA VERBA FIXADA. VERBA ALIMENTAR RECEBIDA EM ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. NATUREZA IRREPETÍVEL. COMPENSAÇÃO INVIÁVEL.
INCIDENTE DE FALSIDADE JULGADO IMPROCEDENTE. ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA QUE RECAI SOBRE A PARTE VENCIDA. JULGAMENTO: CPC/15.

1. Ação de indenização por danos materiais e compensação do dano moral ajuizada em 30/04/2004, da qual foram extraídos os presentes recursos especiais, ambos interpostos em 24/11/2017 e atribuídos ao gabinete em 07/11/2018.

2. O propósito dos recursos é decidir sobre: (i) a sucessão processual; (ii) a negativa de prestação jurisdicional; (iii) a responsabilidade civil do laboratório e a culpa concorrente da paciente; (iv) a comprovação dos danos materiais e a necessidade de liquidação da sentença; (v) o valor arbitrado a título de compensação do dano moral; (vi) a compensação dos valores pagos em sede de antecipação de tutela com os devidos em virtude da condenação; e (vii) o ônus da sucumbência relativo ao incidente de falsidade.

3. Esta Corte tem o entendimento, com base no art. 689 do CC/02, de que são válidos os atos praticados pelo mandatário após a morte do mandante, na hipótese de desconhecimento do fato e, notadamente, quando ausente a má-fé, razão pela qual, requerida a sucessão processual e promovida a devida regularização da representação nos autos, ratificando-se, inclusive, os atos anteriormente praticados, não há falar em inexistência do recurso.

4. Devidamente analisadas e discutidas as questões de mérito, e suficientemente fundamentado o acórdão recorrido, de modo a esgotar a prestação jurisdicional, não há falar em violação dos arts. 489, §1°, IV, 1.013, 1.022, II, do CPC/15.

5. O risco inerente ao medicamento impõe ao fabricante um dever de informar qualificado (art. 9º do CDC), cuja violação está prevista no § 1º, II, do art. 12 do CDC como hipótese de defeito do produto, que enseja a responsabilidade objetiva do fornecedor pelo evento danoso dele decorrente.

6. O ordenamento jurídico não exige que os medicamentos sejam fabricados com garantia de segurança absoluta, até porque se trata de uma atividade de risco permitido, mas exige que garantam a segurança legitimamente esperável, tolerando os riscos considerados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição, desde que o consumidor receba as informações necessárias e adequadas a seu respeito (art. 8º do CDC).

7. O fato de o uso de um medicamento causar efeitos colaterais ou reações adversas, por si só, não configura defeito do produto se o usuário foi prévia e devidamente informado e advertido sobre tais riscos inerentes, de modo a poder decidir, de forma livre, refletida e consciente, sobre o tratamento que lhe é prescrito, além de ter a possibilidade de mitigar eventuais danos que venham a ocorrer em função dele.

8. O risco do desenvolvimento, entendido como aquele que não podia ser conhecido ou evitado no momento em que o medicamento foi colocado em circulação, constitui defeito existente desde o momento da concepção do produto, embora não perceptível a priori, caracterizando, pois, hipótese de fortuito interno.

9. Embora a bula seja o mais importante documento sanitário de veiculação de informações técnico-científicas e orientadoras sobre um medicamento, não pode o fabricante se aproveitar da tramitação administrativa do pedido de atualização junto a Anvisa para se eximir do dever de dar, prontamente, amplo conhecimento ao público – pacientes e profissionais da área de saúde -, por qualquer outro meio de comunicação, dos riscos inerentes ao uso do remédio que fez circular no mercado de consumo.

10. Hipótese em que o desconhecimento quanto à possibilidade de desenvolvimento do jogo patológico como reação adversa ao uso do medicamento SIFROL subtraiu da paciente a capacidade de relacionar, de imediato, o transtorno mental e comportamental de controle do impulso ao tratamento médico ao qual estava sendo submetida, sobretudo por se tratar de um efeito absolutamente anormal e imprevisível para a consumidora leiga e desinformada, especialmente para a consumidora portadora de doença de Parkinson, como na espécie.

11. De um lado, a culpa concorrente do consumidor não está elencada dentre as hipóteses que excluem a responsabilidade do fabricante, previstas no rol do § 3º do art. 12 do CDC; de outro lado, a responsabilidade por eventual superdosagem ou interação medicamentosa não pode recair sobre o paciente que ingere a dose prescrita por seu médico, considerando, sobretudo, a sua vulnerabilidade técnica enquanto consumidor.

12. Para alterar a conclusão à que chegou o Tribunal de origem sobre a comprovação dos danos emergentes, a desnecessidade de liquidação da sentença e a ausência de provas dos lucros cessantes, é necessário o reexame do conjunto fático-probatório, vedado nesta instância por incidência da súmula 7/STJ.

13. Para o arbitramento do dano moral, há de ser acrescentado o fato de que a vítima do evento danoso era pessoa portadora de doença de Parkinson, circunstância agravada pelo fato de contar, à época em que se afastou de seu escritório de advocacia, com mais de 50 anos de idade, fase da vida em que, sabidamente, é maior a dificuldade de retorno ao mercado de trabalho e de recuperação da clientela perdida. Ademais, afastada a culpa concorrente da vítima, circunstância que foi considerada em seu desfavor no momento da fixação do valor da condenação a título de compensação do dano moral, há de ser majorada a verba de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) para R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

14. Reconhecida a natureza alimentar da verba recebida em antecipação de tutela, não há como acolher o pleito de compensação com o valor a ser executado em cumprimento de sentença, em virtude da natureza irrepetível dos alimentos.

15. Se o incidente de falsidade instaurado a requerimento do laboratório foi julgado improcedente, a ele incumbe suportar as respectivas despesas.

16. Recursos especiais de BOEHRINGER INGELHEIM DO BRASIL QUÍMICA E FARMACÊUTICA LTDA e MARIA AMÉLIA SOUZA DA ROCHA-ESPÓLIO conhecidos, sendo desprovido o primeiro e provido, em parte, o segundo.

(REsp 1774372/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/05/2020, DJe 18/05/2020)

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